quarta-feira, 17 de março de 2010

“ A morte do tempo”- segundo Domenico de Massi


 

O sociólogo italiano Domenico de Massi, que em seus estudos e conferências prega as horas livres como estímulo à criatividade, faz alguns alertas e alfineta impiedosamente quem desperdiça seu tempo participando ou assistindo reality show, que chegou em terras tupiniquins com nome de Casa dos Artistas ou Big Brother. Uma verdadeira febre em vários países além do Brasil, esses programas demonstram que ter uma infinidade de horas à disposição para passar o tempo não assegura o surgimento de gênios. O que parece que sai fortalecido, é o papel que o ócio cumpria historicamente no imaginário popular: o pai de todos os pecados.

O que estaria sendo necessário na opinião do sociólogo, é a necessidade de educação para desfrutar o ócio, que ainda é considerado um perigo para a sociedade. O que de fato estes programas revelam, são grupos de pessoas que não conseguem dar sentido ao tempo e ao ócio, o que muitas vezes nem culpa deles são. O negócio, é que não foram educadas para isso. O pior é que do outro lado da tela, há milhões de pessoas que também poderiam estar aproveitando melhor o tempo livre, o que leva o pensador a concluir que programas desse tipo são a morte do tempo.

O sociólogo alerta que boa parte dos competidores estará destruída dentro de um ano. Ele dá o testemunho de um jovem que caiu em grande depressão depois de participar do Grande Fratello, que é como se chama a versão italiana do programa. Esse personagem descobriu apenas tardiamente que era uma celebridade descartável e que cairia fora a medida que outras celebridades igualmente descartáveis iam sendo construídas. Foi o triste desperdício de uma vida humana. Enfim, acabam sendo vítimas tanto os que estão atrás de fama instantânea e sucesso fácil, quanto quem os vê deliciando-se com a farsa que ali é encenada. Neste triste desperdício de tempo e de vidas humanas, o único beneficiado é o empreendedor do sistema midiático que aproveita para capitalizar um pouco mais enquanto houver espaço para esse tipo de entretenimento.

Esses programas, constituem na verdade, caricaturas grotescas se levado em conta o personagem Big Brother, criado pelo escritor George Orwel em sua história que leva por título apenas uma data: 1984. Esse autor é considerado pela crítica, como o escritor político mais influente do século XX. Num exercício de reflexão logo após a segunda guerra mundial, ele denunciava as formas de totalitarismo que haviam surgido na primeira metade do século mas que ainda estavam presentes sob o governo de Stálin na União Soviética. Neste caso, o personagem que ele inventou, era o Chefe de Estado que na sua alegoria vigiava o cidadão nos mínimos detalhes durante 24 horas por dia. Em síntese, o livro de Orwel constitui um apavorante retrato de uma sociedade totalitária que pune o amor, destrói e banaliza a intimidade das pessoas e distorce a verdade. Os globalitarismos, ou seja, as formas de totalitarismo em tempos de globalização, fizeram com que muitas vezes, por estes dias, se lembrasse a história de Orwel. A mídia, na falta de algo mais criativo, roubou o personagem de Orwel e numa inversão grosseira reinventou a história de acordo com seus interesses, pois havia espaço para isso. Ao banalizar a intimidade e o ócio, o sistema midiático transformou artistas e espectadores em vítimas e num golpe de misericórdia, matou o precioso tempo para os que acabaram caindo na armadilha.

 Fonte: WWW.uol.com.br/entrevista

Um comentário:

Neli disse...

"A morte do Tempo", este título bem escolhido, retrata bem e resume o que vem como consequência a programas vazios - como o Big Brother's. Realmente é um tempo perdido.